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Jul
09

Entrevista : Ética e certificação de sites


Por esta altura do ano costumo receber algumas perguntas de estudantes que estão a terminar trabalhos para cadeiras de Comunicação. Eu tento sempre responder o melhor que posso e  espero contribuir para o seu sucesso. Às vezes saem-me umas preciosidades, outras vezes é complicado. Esta foi 50/50.  A Marta Gonçalves Pereira é estudante do terceiro ano da Universidade Lusófona, e entrevistou-me sobre a certificação de sites, a partir da ideia apresentada por Pat Thornton. Eu na altura quando li o o post de Thornton fiquei com pena de não poder escrever um texto sobre o assunto, mas tinha as minhas dúvidas sobre uma série de coisas. Com estas respostas percebi que dúvidas eram essas e sem querer acabei por me desviar um pouco do assunto inicial, mas a Marta fez um interessante apanhado das minhas ideias no seu trabalho. Abaixo fica a transcrição completa do que lhe disse.

Segunda feira vou postar mais uma entrevista feita por outra aluna da Lusófona, essa mais centrada sobre questões éticas.

1. O que é a certificação de sites?

De acordo com a ideia de Pat Thornton, seria uma forma de destacar sites informativos que cumprissem com certas regras de qualidade e que operassem dentro de práticas correctas. Isto seria uma forma de separar o trigo do joio, os produtores dos parasitas de conteúdos informativos, e valorizá-los pela qualidade do seu trabalho. Isto é o conceito idealista. O lado complicado é a criação de um padrão que teria que ser estabelecido não sabemos por quem e aceite por todos, e consensos numa indústria que se encontra cada vez mais fragmentada é quase impossível. Além disso, um grupo de comunicação pode de repente decidir que a certificação existente não lhe convém e cria uma outra, e depois outro e assim sucessivamente. Mesmo gerida por uma entidade independente, duvido que seja uma realidade funcional.

Nós vemos que em certos produtos existe certificação – nos vinhos, por exemplo – e creio que o princípio seria basicamente o mesmo, a atribuição de garantias de qualidade a um produto por cumprir parâmetros considerados ideais.

2.Justifica-se haver um selo ético online para os sites de informação jornalística?

Justifica haver transparência nos processos jornalísticos, e online é possível ser-se mais transparente devido à natureza do meio. A pergunta deveria ser:

“justifica-se haver um selo etico online para os MEIOS de informação jornalistica?”. Porque não exigimos o mesmo aos jornais, às TVs e às rádios? A diferença está na licença que é atribuída aos meios de comunicação tradicionais, e que obriga os operadores a cumprirem com um grupo de regras, mas se podem ser sancionados por incumprimentos legais, não o são por quebrarem valores éticos ou se produzirem informação de baixa qualidade. Podem dizer que a diferença agora é que qualquer pessoa pode ter um orgão de informação online. Eu digo que antes qualquer pessoa com muito dinheiro podia ter um jornal, uma rádio ou um grupo de comunicação inteiro, esse é o ponto de quebra com o status quo estabelecido dentro do Quarto Poder.

Como o público online não é passivo como o público da televisão, por exemplo, acho que o selo não se justifica. Os próprios utilizadores é que fazem a regulação, escolhendo as fontes que mais confiam e onde se sentem mais à vontade – a informação na web tem um factor de envolvência importante. As televisões não têm selo ético e o telejornal mais visto em Portugal é provavelmente o pior deles todos, a nivel de qualidade e ética, mas é o mais visto. Não é o selo, por mais válido que seja, que vai credibilizar ou atrair mais público. A credibilidade é feita com trabalho, o público é uma questão de saber o que se diz, como, e a quem. O resto acontece por si mesmo.

3. Quais são as vantagens e desvantagens?

Vantagens: o Pat Thornton comparou esta ideia ao selo Creative Commons, o que é um excelente paralelo, ou seja, sendo uma ideia universalmente aceite, existiria forma de promover conteúdos de qualidade sob uma marca comum. Seria como uma espécie de “rede social de conteúdos” onde sabemos que o que circula dentro dessa rede obedece a padrões elevados de qualidade. Essa consensualidade criaria um nível superior de conteúdos, separado dos restantes, que seriam piores, e/ou parasitários.

Desvantagens: essa separação dava logo justificação para começarem a cobrar (mais) pelos conteúdos abrangidos pelo selo. Além disso, quem trabalha sabe que os erros acontecem e às vezes não se faz tudo como se devia. Só quem não faz nada é que nunca falha. O que aconteceria então? Haveria um sistema de controle para verificar esses erros? E seria capaz de avaliar os milhares de sites existentes? E que credibilidade teria o organismo regulador e fiscalizador? Se se pode trabalhar em crowdsourcing, até que ponto o público interviria nas decisões do organismo? E se houvesse quem não aceitasse as condições do selo e criasse um novo, concorrente? Há muitas questões funcionais que prejudicam a criação do selo.

Além disso creio que pode promover a ideia de elite e de clube fechado, o que é exactamente o que na minha web-filosofia se deve evitar.

4. Qual a sua opinião sobre a ideia do selo ético online?

Apesar de ser interessante como conceito, acho que é uma atitude defensiva por parte dos criadores de conteúdos. Acredito na autoregulação e na contribuição dos utilizadore, esses sim os verdadeiros reguladores. O mercado é demasiado competitivo para nos preocuparmos com atitudes protecionistas, é preciso é fazer o melhor que se sabe e esperar ter sucesso. Se falharmos eticamente será o nosso público (e os restantes)que nos irão pedir contas, apontar os nossos erros, e se estivermos a fazer tudo bem podemos até ganhar o respeito dos outros admitindo e corrigindo as nossas falhas. A ética serve para nos orientarmos correctamente nas nossas práticas profissionais e criarmos algo que seja socialmente valioso, neste caso, informação. Mas acho que apesar de ser uma linha de conduta profissional, de nada vale se não houver um empenho pessoal: se houver desonestidade por parte do indivíduo, duvido que não se reflicta na prática do profissional. A certificaçãoexterna é uma boa forma de incentivo mas não vem resolver nada, numa questão que é fundamental para a credibilização de uma actividade fundamental em qualquer sociedade que pretenda viver em liberdade e consciência.

No fundo, acho que é uma boa ideia, e que rapidamente seria desvirtuada por interesses externos.


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