O que se passa no Primeiro de Janeiro devia ser um escândalo. Mas não, afinal é apenas mais um episódio na vida empresarial portuguesa. 32 jornalistas foram despedidos de forma ilegal e viram os seus lugares assumidos por colegas de uma publicação paralela, e a sede da empresa que os despediu fica num antigo stand de automóveis abandonado há dois anos. Uma semana de vergonha em resumo.
O Primeiro de Janeiro tem 140 anos de história e é uma das mais antigas publicações em Portugal. Mais, é uma das referências principais do Norte do país. Os problemas com o jornal não são de agora: há já alguns anos que se ouve falar do fim da publicação. Este diário de cariz regional atravessava já algumas dificuldades, mas o despedimento de 32 funcionários assumiu contornos no mínimo estranhos – menos para quem conhece a realidade empresarial portuguesa, e as estruturas dos pequenos grupos de comunicação, que controlam jornais e rádios locais, e que são recorrentes em práticas de gestão duvidosa.
-
Jornalistas à porta Foto-Pedro Tavares
Ainda antes de serem despedidos a semana passada, os jornalistas do Primeiro de Janeiro já não tinham grandes condições de trabalho: não eram aumentados há sete anos, e existem indicações de má gestão quer da empresa, quer da redacção. No último editorial que escreveu , a directora Nassalete Miranda dizia:” Há períodos na vida das instituições, como na das pessoas, em que se precisa parar um pouco para preparar o futuro. O PRIMEIRO DE JANEIRO vai parar uns dias para ressurgir mais forte, com novo grafismo, com nova dinâmica.” Mas o que se viu não foi uma renovação. No sábado seguinte ao despedimento que os jornalistas se recusaram a assinar, eles tentaram voltar aos seus postos de trabalho, mas foram impedidos de entrar. Os dez jornalistas de outra publicação do grupo – Norte Desportivo – assumiram a criação de conteúdos das duas edições.
-
Primeira edição do “novo” Primeiro de Janeiro
No editorial de regresso, assinado pelo novo director Rui Alas Pereira, na terça-feira seguinte podia-se ler: ” E vamos continuar por aqui, (bem) dispostos a lutar para que os tempos novos da bonança possam fazer um JANEIRO ainda mais forte, rejuvenescido e perfeitamente adaptado à modernidade. Daí que a nossa aposta passe também pela renovada edição on-line, certamente uma referência do que melhor se faz neste País digital…”
O site do jornal é neste momento uma imagem da capa com um pdf integral da edição do dia. Se isto é o que o novo director acha que é do melhor que se faz, então não sei realmente se terá conhecimentos suficientes para avaliar seja o que for relacionado com as novas formas de comunicação…
Entretanto, os trabalhadores despedidos viam a sua situação avaliada pelo Sindicato dos Jornalistas, pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social e pelo Ministério do Trabalho, que considerou o despedimento colectivo como ilegal.Na semana passada entregaram um manifesto à governadora civil do Porto, para chamar atenção para o caso. Nesse manifesto destacam a prática contínua de ilegalidades por parte de Eduardo Costa, dono da Fólio e da Sedico, as empresas proprietárias do Primeiro de Janeiro:
“Estas práticas vão «desde a ausência de seguros para os trabalhadores à prática de troca de facturas por salários, passando pelo não pagamento de Julho e dos subsídios de férias, bem como o pagamento de Junho apenas pelo valor do salário mínimo nacional».
Consideram que o processo envolve a prática de «lock out», já comprovado pelas autoridades competentes e recordam que «Eduardo Costa foi condenado por fraude ao Estado na obtenção de subsídios, o que não impediu que bem recentemente fosse de novo contemplado com fundos do Quadro de Referência Estratégico Nacional – os fundos comunitários para 2007/2013)”.
Aliás, Eduardo Costa é muito contestado ao longo de todo este processo.
A empresa ou a figura de Eduardo Costa
Eduardo Costa é um dos mini magnatas da comunicação em Portugal. Empresário muito conhecido no Norte, tem ligações ao desporto e à imprensa regional: é presidente da Direcção da União Desportiva Oliveirense, de Oliveira de Azeméis, e também é dono de vários órgãos de comunicação regional -‘O Primeiro de Janeiro’ ,“os semanários ‘Correio de Azeméis’ e ‘Praça Pública’, de Ovar, e ‘Caima’, as rádios Azeméis FM e Voz do Caima e a gráfica Coraze, que imprime a grande maioria dos jornais regionais do Norte.” Sobre ele pesa uma condenação de dois anos e meio de prisão por fraude, suspensa por um ano, por obtenção indevida de subsídios do Estado com o jornal ‘Recortes de Província’. Para além de deter vários títulos locais e regionais, é vice-presidente da Associação Portuguesa da Imprensa Regional.
Quando os jornalistas foram investigar a morada da Sedico – Sociedade de Edição e Comunicação, proprietária do Primeiro de Janeiro, e de onde foram emitidas as cartas de despedimento, encontraram um stand de automóveis abandonado há dois anos. No chão, os avisos de recepção das cartas que lhes foram enviadas na semana anterior.
Os jornalistas despedidos avançaram com uma queixa em tribunal, pela prática de lock out, e têm tido apoio de alguns grupos políticos, particularmente do PCP , do Bloco de Esquerda e do PS.
Um retrato português
O que se passa no Primeiro de Janeiro sempre se passou a nível regional. Marcas detidas por grupos de comunicação de dimensão e e influência pouco claras vivem situações semelhantes, mas passam despercebidas por serem estruturas menores e com menos visibilidade. Este caso é a ponta do icebergue com o qual a imprensa regional chocou. e afunda-se rapidamente, não só pela falta de visão dos seus directores como pela falta de escrúpulos dos seus proprietários. Outras das razões é o envelhecimento de uma força de trabalho que aprendeu a profissão na tarimba, e que se vêem ultrapassados por uma realidade que nem compreendem, conhecem, ou querem aceitar. O leitores é que sofrem, e deixam de comprar estas publicações que deviam ser representantes dignos da sua região, da sua realidade.
Infelizmente, as pessoas que criam estas situações estão a matar lentamente a sua galinha dos ovos de ouro, e o pior de tudo, é que quando morrer, só sofre a galinha.
Muitas das fontes usadas para este post foram recolhidas aqui: E s g r a v a t a r – blog de Filinto Melo
Hey! I see you cut your holidays short… and no less for this that I’m reading right now!
Not only this is an insult to the media community in general, but also a proof that when these wannabe media corporate idiots want to get away with it, they seem to do just that. The reality of the media in Portugal is offensive, and honestly, I don’t know why universities even bother to keep on teaching Journalism and Communication, if your options are to become a slave of some redneck who has no respect for the job.
And I’m not even getting started with my rant!