A primeira vez que ouvi o Jeff foi em Setembro de 1996. Um amigo meu emprestou-me o “Live at Sin-é” e fiquei completamente agarrado à voz, à guitarra, à intensidade das canções. Nunca tinha ouvido ninguém entregar-se assim a uma música, com tanta abrangência de emoções. Sempre que ouço a versão do “The way young lovers do”, um original de Van Morrison, tenho arrepios a meio daquele scat impetuoso a trepar oitavas sem hesitações, a voz a atingir um domínio inacessível à maioria dos mortais. Mas para além disso, o Jeff era um compositor fabuloso e um excelente executante, acreditem em mim, eu sei muito bem a dificuldade que eu tive para aprender a tocar as músicas, é preciso esquecer o que já se sabe porque as regras nas canções dele são completamente diferentes.
Depois não tive hipótese senão comprar o “Grace”, a sua obra perfeita e acabada, e incompreensivelmente ignorada, editada em 1994. O álbum abre com “Mojo pin”, uma canção sobre a ausência misturada com uma dose brutal de sensualidade e sofrimento, o desejo por satisfazer, esta versão muito mais elaborada do que a do EP (afinal é uma gravação de estúdio e não uma performance ao vivo), com a banda – Mick Grondahl no baixo, Matt Johnson na bateria, Michael Tighe na guitarra e Gary Lucas o elemento extra mas preponderante nesta gravação. Aliás, é no estúdio que o Jeff tem espaço para dar às suas músicas toda a dimensão que merecem, basta ouvir os pormenores nos coros do “Lover, you should’ve come over”, outra das mais extraordinárias canções que eu já ouvi e que me tem servido de banda sonora vezes demais, mas isso é outro problema…
Mas o álbum não é feito só das músicas dele. Em 10 faixas há 3 versões: “Lilac wine” creditada a um J. Shelton- ainda não sei quem ele é- “Hallellujah” de Leonard Cohen mas com a letra alterada, e uma preciosa versão de Benjamin Britten, “Corpus Christi carol”, todas elas a viver da voz e da guitarra, e também do empenho emocional que só o Jeff conseguia ter.
Muito provavelmente ouvi este álbum pelo menos uma vez por semana desde que o tenho, e houve uma altura em que o ouvia várias vezes ao dia. Parece que nunca me farto.
Só que, quando eu já começava a sonhar na possibilidade de o vir a ver ao vivo, chegou a notícia no fim de Maio de 97 que ele tinha desaparecido no rio Wolf, no Mississipi, depois de ter estado a tocar guitarra com um amigo e a beber. Entrou na água vestido e a cantar Led Zeppelin, estava-se a ver que ia dar asneira… e ao mesmo tempo não me surpreende nada, estava na sua maneira de ser fazer uma coisa dessas. Houve algumas teorias de alguns jornalistas que apontavam para o suicídio, mas acho que são um pouco exageradas. Ele foi apanhado pela ondulação de um barco que passava e teve azar. E é tudo.
Sobravam agora as gravações piratas, os singles, e um vazio enorme no panorama musical. Por todo o lado foram surgindo músicos que assumiam a influência do trabalho dele, houve homenagens sentidas de fãs como eu, anónimos e devotos que se preocuparam em manter a música do Jeff viva mostrando-a a outras pessoas, partilhando-a com quem mais gostam. É isso que eu tenho feito e continuo a fazer aqui mesmo.
Com o tempo foram surgindo as inevitáveis compilações, as gravações ao vivo, pouca consolação para quem ainda esperava tanto. “Sketches for my sweetheart the drunk” tem as faixas que provavelmente ele iria gravar no próximo álbum, mais algumas versões caseiras feitas em quatro pistas e a música que passaram na cerimónia fúnebre, “Satisfied Mind” gravada num programa de rádio em 92; depois vieram o “Mistery White Boy” e o “Live a L’Olympia”, em que podemos ouvir toda a energia que ele tinha perante uma sala cheia de gente. E o DVD “Live in Chicago” em que podemos ver o personagem que ele era: se durante as músicas imperava a intensidade e a emoção, nos intervalos era o humor e as brincadeiras com as referências musicais a contrastar com a seriedade que o seu desempenho necessitava.
Agora estou condenado a comprar as mesmas músicas em todas as versões que aparecerem no mercado e procurar outras que não façam parte dos catálogos oficiais. Mas eu não me importo. Só tenho pena de nunca poder vê-lo em concerto.
Jeff Buckley nasceu em 17 de Novembro de 1966 em Orange County, Anaheim, Califórnia. Era filho de Mary Guibert e Tim Buckley, outro músico especial.
Morreu a 29 de Maio de 1997 porque fazia falta no coro dos anjos.
Mas a música dele fica. Para sempre.
(texto criado em 2001, para o meu antigo website)
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The first time I heard Jeff was in September 1996. A friend of mine lent me “Live at Sin-é” and I was totally hooked to the voice, to the guitar, to the intensity of the songs. I’ve never heard someone give himself like that to a music, with such broad emotions. Everytime I hear the cover of “The way young lovers do”, a Van Morrison original song, I shiver halfway that impetuous scat climbing octaves with no hesitations, the voice reaching an inacessible domain to the majority of us mortals. But besides that, Jeff was a fabulous composer and an excellent performer, believe me, I know the trouble I had to learn how to play the songs, you must forget what you already know because the rules in his music are tottally different.
After that I had no chance but to buy “Grace”, his perfect finished work, and uncomprehensibly ignored, edited in 1994. The album begins with “Mojo pin”, a song about absence mixed with a brutal dose of sensuality and pain, unfulfilled desire, this version much more elaborate than the one on the EP (after all is a studio recording and not a live performance), with the band – Mick Grondahl on bass, Matt Johnson on drums, Michael Tighe on guitar and Gary Lucas as the extra element yet preponderant on this recording. Besides, it’s in studio that Jeff has room to provide to his music all the dimension it requires, just listen to the details on the chorus of “Lover, you should’ve come over”, one of the most extraordinary songs that I’ve ever heard and that has worked as a soundtrack for me too often, but thats another problem…
But the album isn’t made only with his songs. In 10 tracks there are 3 covers: “Lilac wine” credited to some J. Shelton- I still don’t know who he is- Leonard Cohen’s “Hallellujah” but with the changed lyrics, and a precious version of Benjamin Britten’s “Corpus Christi carol”, all of them living off of voice and guitar, and also from the emotional commitment that only Jeff could have.
It’s very likely that I’ve heard this album at least once a week since I bought it, and there was a time I heard it several times a day. It seems I never get enough.
But, when I was dreaming about the possibility of seeing him live, the news came by the end of May ’97 that he disappeared in the Wolf river, Mississipi, after being playing guitar and drinking with a friend. He walked into the water with his clothes on and singing Led Zeppelin, you could tell it was a bad idea…and, at the same time, it doesn’t surprise me at all, it was in his way to do such thing. There were some theories by some reporters that claimed suicide, but I think they’re a bit exaggerated. He was caught by the undulation of a passing boat and was unfortunate. And that was it.
Now there were only left the bootlegs, the singles, and a huge void in the music scene. Everywhere musicians came assuming his influence on their work, there were felt tributes from fans like myself, annonimous and devoted that cared about keeping Jeff’s music alive showing it to others, sharing it with those they love the most. That’s what I’ve been doing and still do right here.
In time came the inevitable compilations, the live recordings, not much for those who still expected so much more. “Sketches for my sweetheart the drunk” has the tracks he would problably record on the next album, plus some few more homemade 4-track demos and the music that was played at the funeral service, “Satisfied Mind” taped in a radio show in ’92; then came “Mistery White Boy” and “Live a L’Olympia”, where we can hear all the energy he had before a crowded room. And the DVD “Live in Chicago” where we can watch the charachter he was: if during the songs intensity and emotion ruled, in-between was humour and the playing with musical references that opposed to all the gravity his performance needed.
Now I’m doomed to buy the same songs in all available versions on the market and to look for others that don’t exist on official catalogues. But I don’t mind. I’m just sorry I can’t ever see him live.
Jeff Buckley was born on the 17th November 1966 in Orange County, Anaheim, Califórnia. He was son of Mary Guibert and Tim Buckley, another quite special musician.
He died 29th of May 1997 because the choir of angels needed him .
Still, his music remains. Forever.
(text published on my old website, created in 2001)
ohhhhh, thank you for posting this.
vim parar aqui porque procurava imagens do jeff. identifiquei-me bastante com o que escreveste. quando o ouvi pela 1ª vez ele já cá não estava…
Olá, eu só o conheci em fins de 2006.. tenho procurado tudo dele..é quase impossivel encontrar as musicas todas dele mas ja tenho cerca de 110…! É pena, a carreir dele ter acabado tao cedo!
Confeço que prefiro as musicas do pai,Tim B., a voz dele encanta-m,os ritmos..tudo..é a perfeição!!! Ja agora aconselho a ouvirem tambem o Nick Drake,é mais simplista, p kem nao conhec ainda(também morreu…!)
Os génios duram pouco…! Sao os meus três Deuses da musica.. Beijo p tdos